Não fosse Missalonghi Wright viver nas Montanhas Azuis da Austrália nas primeiras décadas do século XX, e a sua vida poderia muito bem dar uma canção de dança nos anos noventa do ido século.
Tudo à sua volta era castanho: a casa, a mobília, as cobertas, as cortinas e as colchas. Castanho, castanho, castanho. A cor da dignidade, que nunca parece gasta por muito que esteja, que nunca passa de moda e que nunca compromete. E isso era tudo o que Missy Wright estava destinada a ter: dignidade, de parente pobre numa cidade que parece parada no tempo, onde todos se conhecem. A cidade perfeita onde todos são loiros, obscenamente altos (Missy, com o seu 1,82, é praticamente a anã da cidade), de proporções razoáveis, vestindo damasco e cor-de-rosa.
Aos trinta e três anos, a sua grande transgressão resume-se a ler romances de amor às escondidas da sua dominante mãe, quando não está ocupada a ordenhar Buttercup – a vitela de estimação – ou a fazer queijo. Transgressões que não lhe pareciam apresentar grandes perspectivas fora da sua opressiva família marcadamente patriarcal, onde se sentia como um elefante numa loja de cristais. Missy Wright não era bonita, sofisticada ou rica, e até era a única mulher morena, magra e de olhos castanhos numa cidade consagrada ao universo de Lord Byron, que abominava a diferença.
Missy não parece assim ter muito mais a almejar na vida do que a sua enfadonha e desbotada rotina, até que dois estranhos, vindos de longe, entram na pacata cidade de Byron, levando a que uma série de enganos – combinados com a sua imaginação prodigiosa e o mundo de fantasia que encontra nos livros – a levem a pensar ou a desejar ter uma fatal doença cardíaca. Missy Wright decide então que nada tem a perder – afinal de contas, nada é o que sempre teve.
Conseguirá encontrar a coragem que necessita dentro de si para largar o seu pequeno mundo castanho e agarrar as rédeas do seu próprio destino? Poderá um simples vestido de renda vermelha quebrar a ordem instituída e trazer novo alento às mulheres oprimidas de Byron? É o que o leitor irá descobrir em “As Senhoras de Missalonghi” (Bertrand Editora, 2019), originalmente editado em 1987.
Nascida na Austrália em 1937, Colleen McCullough iniciou-se na escrita com “Tim”, publicando em seguida o bestseller “Pássaros Feridos”, recordista de vendas. Ambos foram adaptados ao cinema. “O primeiro Homem de Roma” é uma série histórica escrita em seis volumes, que retrata os primórdios da Roma Antiga e valeu rasgados elogios à autora por parte de personalidades como Kissinger. Os dois volumes da sua série policial, intitulada “Carmine Delmonico”, encontram-se publicados também sob a chancela da Bertrand Editores. Morreu em 2015 na ilha de Northfolk, aos setenta e sete anos.
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