Por baixo da pele dos americanos DIIV escondem-se muitas nervuras: anda por ali a intensidade alucinada dos primeiros discos dos Nirvana, o baixo assertivo do pós-punk e as barragens de guitarra ondulantes dos My Bloody Valentine – energia complementada com o algodão doce onírico do shoegaze.
Fora dos palcos, a banda de Brooklyn carrega às costas uma biografia conturbada. É bem conhecida a relação do frontman Zachary Cole Smith com os usos e abusos da heroína. Smith e a então namorada Sky Ferreira chegaram a ser detidos por posse de droga, em 2013, caindo nas garras dos tablóides. Já no ano passado, a banda foi obrigada a despedir o baixista Devin Perez por causa de comentários sexistas, racistas e homofóbicos que fez numa rede social. Peripécias à parte, surge agora o terceiro registo, “Deceiver” (Captured Tracks, 2019), a primeira novidade desde “Is The Is Are”, bem recebido álbum de 2016.
“Deceiver” é um disco que os encontra a pisar terreno mais firme. As canções perderam a leveza propulsiva do álbum anterior e ganharam riffs de guitarra mais pesados e sólidos. A atmosfera é mais soturna, mais carregada. A voz de Zachary Cole Smith aparece menos nublada do que nos dois discos anteriores, o que dá mais destaque às letras.
O pontapé de saída do álbum chama-se Horsehead, e nasce de uma textura de guitarras a puxar ao grunge, a fazer lembrar as dinâmicas sonoras de bandas como os Smashing Pumpkins. Passeamos com o vocalista pelas salas estanques de clínicas de reabilitação, e continuamos o passeio numa toada mais lenta em Like Before You Were Born.
Skin Game foi o primeiro single conhecido, teia de guitarras à la Sonic Youth onde se revisita o processo de autodestruição e recuperação do frontman. “Há luz e sombra em quase todas as canções do disco”, já declarou Zachary em entrevista recente. Canções como The Spark e a inspirada Blankenship atestam o facto: são temas animados e energéticos, mas têm também um lado negro, uma faceta nova nos DIIV.
Esta dualidade é bem visível em Acheron, o tema final – com mais de 7 minutos, é a música maior do álbum, atravessando várias fases até um final apoteótico de guitarras dissonantes, a fazer lembrar os My Bloody Valentine. Um tema sombrio como uma carta de condolências, sem sombra de esperança.
“Deceiver” acaba por sofrer com a repetição: os temas são algo semelhantes entre si, e a audição do disco por inteiro depressa começa a cansar, pese embora a produção cuidada e as variações de velocidade entre temas. De qualquer forma, é uma impressionante prova de vida de uma banda que parecia condenada a trilhar o caminho da polémica até à irrelevância.
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Os DIIV vão estar em Portugal em 2020, com duas datas integradas na digressão europeia de Deceiver. A 19 de Março tocam no Hard Club, no Porto, e a 20 de Março apresentam-se no Lisboa ao Vivo. Os bilhetes custam 22 euros, e já estão disponíveis nos locais habituais.
Promotora: At The Rollercoaster
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