Se, por aqui, tivéssemos de atribuir um prémio para o melhor gestor de recursos SBSB 2019 – para além daquele tipo simpático do bar -, este iria direitinho – e sem qualquer ponta de hesitação – para Masego. Com berço jamaicano e um nome sacado aos livros sul-africanos que ajudam a decidir que assinatura terão os bebés num futuro com que ainda não sonham, Masego desempenhou uma série de papéis, desde o malabarista que nos poderia pedir uns trocos no semáforo como aquele tipo armado em Don Juan que não hesitaria em nos sacar a miúda com boa conversa e jogo de cintura.
Sim, este Masego sabe-a toda e de cor. A certa altura, e tudo em nome da estatística, lança para o ar um “Quantas senhoras há aqui hoje?“, cantando como quem não quer a coisa que “…she can be my girlfriend“, enquanto tratava de atirar umas rosas bem vermelhas. Ainda neste campo romântico, promete uma medalha a uma senhora dos seus cinquenta que se encontra na linha da frente, eleita a Sugar Momma deste final de tarde.
Mas nem só de sedução à próxima se faz um concerto de Masego, que mostrou ter potencial para chegar a qualquer praça, feira ou rotunda e actuar como o homem dos sete instrumentos. Para além de cantar como um menino do coro a quem se entregaria de boa vontade todos os solos, mostrou ainda dotes de trompetista, uma paixão pelo beatbox e, a certa altura e com alguma distinção, um jeito tremendo para gravar pistas, colocando a temperatura muito perto do alerta vermelho.
Há, ainda, tempo para sacar da cana de pesca e aproveitar o mar ali tão perto – “Shawty Fishin (Blame the Net) -, preparar uma poção para o envelhecimento – “Age ain’t nothing but a number“, diz, antes de uma esmerada versão de “Old Age” -, fazer umas flexões, rodar três bolas como uma malabarista experiente, entrar num duelo de saxofones ou mostrar a todos como uma garrafa de água deve ser bebida com estilo.
Tratando de ter sempre o público bem desperto, Masego foi pedindo para se irem repetindo onomatopeias em língua estrangeira – ou simplesmente gritando como se não houvesse amanhã -, fazendo deste um concerto para todas as gerações: “Sabem o que é fixe? Ter aqui gente de todas as idades“. Um concerto onde, qual Panoramix, Masego tratou de juntar no mesmo caldeirão um ramo de trap, uma pitada de jazz, uma colher de funk e um frasco inteiro de soul, cozinhando uma poção mágica cujos efeitos se fizeram sentir o dia inteiro.
Quem diria que, do fundo do seu – arriscamos – metro e meio, Orono Noguchi se iria revelar uma bully de todo o tamanho, conquistando o público através de uma confrontação que poderia ter acabado numa sessão de pancadaria? Ainda que, duvidamos, alguém conseguisse bater numa coisa tão delicada como Orono.
Desta vez, os Superorganism entram em palco sob a bênção do incenso, envergando mantos com capuzes de cores vivas, mas só depois da sempre útil explicação científica do que é, afinal, isso de se ser um superorganismo. Mal a coisa tinha começado e já Orono se metia com um fã que envergava uma T-Shirt onde se lia “Your favourite band sucks”. “Are we your favourite band? Do we suck?”, atira em desafio.
Mais lá para a frente, pede que sejam levantados braços em jeito de adeus, mesmo “por aqueles que estão aqui para ver outra banda”. Um tipo que carrega o clássico peluche do sapo recebe, depois de um (des)tratamento pessoal, a alcunha de Ninja Organism 69, e logo depois estamos agachados em “Relax” antes de 5 segundos em modo canguru. “You want another song, dad? Are you gonna finnaly visit me? I`m such a losser”, disserta antes do hit “Nobody cares”.
Confessa estar a divertir-se e diz mesmo ser este o seu espectáculo preferido da tour, lembrando-se a certa altura de já terem tocado em Portugal. Foi em 2018 no Primavera, e nessa altura Orono estava, pelo que vimos, apenas com meia carga. “I like Portugal. You get your shit done, unlike other countries”, atira antes de se meter com a malta com chapéus de palha da EDP enfiados na cabeça: “Why the cowboy hats?”.
Com um baterista e um teclista que marcam o ritmo e um trio que se ia dividindo entre a dança, o canto, o teatro e a tarefa de segurar peças de fruta com carinho, os Superorganism deram um concerto encantadoramente intimidante, que valeu sobretudo pela boa disposição que Orono trouxe ao Meco.
Antes de tudo isto, Rubel esteve em palco com uma banda de 8 músicos, que como um grupo de super-anões envergava o clássico barrete vermelho que Seu Jorge também enfiou na cabeça no filme “The Life Aquatic with Steve Zissou”. E, se houve espaço para o humor com o tema “Chiste”, gravado a meias com Rincon Sapiência num vídeo em que o par protagoniza uma dança caricata brincando com os concursos televisivos de talentos, não faltou a crítica social com “Mantra”, ilustrado ao vivo com imagens de uma repressão policial passadas em câmara lenta, que terminou com silêncio e Rubel a gritar “Ele não!”. Não faltou também o hit “Quando bate aquela saudade”, que os fãs de telenovelas – e uns outros tantos – conhecem de trás para a frente. Tem charme e voz, este miúdo.
Agora que a festa terminou, a ressaca foi curada e já vai custando menos levantar de manhã, façamos um balanço e uma apologia do lugar. Apesar do estado de sítio do primeiro dia do festival, continuamos a defender que o Meco é, de longe, a melhor casa para este Super Bock Super Rock. Estruturalmente há muita coisa a afinar para a próxima edição, seja melhorar a sinalética (dentro do recinto e fora dele), criar um maior número de zonas de lazer, aumentar a iluminação na zona dos parques de estacionamento e da saída do recinto, pensar nos que têm dificuldades de mobilidade ou arranjar forma de os transportes públicos e privados poderem chegar e estacionar sem sobressaltos. Mais fácil será, por exemplo, eliminar as zonas vip na frente do palco, muitas vezes vazias durante os concertos, algo que chegou a merecer reparos da parte de algumas bandas. Seria também interessante regressar ao lugar anterior do SBSR, com muitas árvores, desníveis e recantos que conferiam, a cada palco, uma identidade muito própria – mas, se tiver mesmo de ser, que o novo lugar permaneça. Afinal, é sempre bom regressar a um lugar onde fomos felizes.
O Super Bock Super Rock regressa ao Meco em 2020 e já tem datas marcadas: 16, 17 e 18 de Julho. Se não for pedir muito, tragam os Gorillaz. Ou a Taylor Swift.
Fotos: Tiago Ferreira
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