É, no que toca às séries de animação televisivas apontadas a miúdos e graúdos, uma das mais fascinantes e que, apesar do sucesso alcançado, não embarcou no espírito moderno das reposições desenfreadas. Foi o próprio Alex Hirsh, o criador da série, que recusou ir além das duas temporadas originais, não recusando porém alguns episódios especiais ou comemorativos para o tempo que há-de vir.
Para quem acompanha a série, esta edição de “Gravity Falls: Diário 3” (D. Quixote, 2018) está ao nível de um achado arqueológico ou mesmo de uma pegada de dinossauro, já que é por ele que passa muito da trama da série. Um diário – e uma edição – descrito desta forma por Hirsh: “288 páginas coloridas de um verdadeiro tesouro cheio de segredos nunca antes revelados, monstros e mistérios da pacata cidade de Gravity Falls”. Resumidamente e sem apontar a spoilers, este é um de três diários que, quando reunidos, permitirão a entrada num portal mágico que, rezam as crónicas, não deverá mesmo ser invocado – ou o mundo irá acabar ou algo parecido.
Passaram-se seis anos desde que o misterioso autor do diário começou a “pesquisar os estranhos e assombrosos segredos de Gravity Falls, no Óregon”, desde que deu conta da existência de uma “excentricidade geográfica”. A pergunta que se impõe é mais ou menos esta: “Porque é que só por si este sítio remoto acolhe mais fenómenos paranormais e fora do comum e excepções à regra do que qualquer outro lugar da Terra?”.
À boleia de uma bolsa de estudo, o autor do diário decide embarcar numa missão com a cara do Tom Cruise, propondo-se investigar as excentricidades de Gravity Falls, descobrir a teoria geral e unificada do insólito e, por fim, publicar a teoria e juntar-se às fileiras de Newton, Tesla e Einstein. Autor do diário que revela ter seis dedos em cada mão, o que em pequeno o fazia refugiar-se muitas vezes na biblioteca, “devorando livros acerca do sobrenatural, em busca de outras aberrações” como ele próprio, que se considerava um excêntrico.
E que investigações e excentricidades esconde, então, este Diário? Muitas, como por exemplo: os Gnomos, com uma altura média de 25 a 45cm (incluindo o chapéu); os Duencórnios, mistura de duende com unicórnio, que têm moedas de ouro – só que de plástico – na barba e que normalmente surgem “junto a arco-íris e a flocos de pequeno-almoço açucarados e coloridos”; o Poço Sem Fundo, ou “Poço de Moebius”, com a particularidade de “muitas das coisas que são atiradas lá para dentro regressam, outras nem por isso”; vários e incríveis tipos de fantasmas, como o Gabarola dos Sonhos, Fantasmas da Dor ou Glutões.
Há também bunkers secretos, uma estranha Feira, a arma da memória, o olho cego, esconderijos à balda, páginas em branco e, a meio do livro, o surgimento de um novo autor, chamado Dipper Pines, que o terá encontrado por acaso, dando assim continuidade a uma obsessão – o diário, aliás, irá mudar várias vezes de mãos. É ele que irá enfrentar o Bill Cipher, “um pesadelo encapotado que irá seduzir-vos com infindáveis elogios, até obter aquilo que quer – e o que ele quer é a destruição deste realidade!”.
O Diário presta igualmente o serviço público de contar um pouco a história de Gravity Falls e de todos os mistérios que giram à sua volta, apresentando também as muito bem desenhadas personagens que habitam a série – como o Soos, a Wendy Corduroy, a Mabel Pines ou o Tio Stanley – e pistas e revelações sobre o fundador da cidade.
O trabalho gráfico e as Ilustrações de Andy Gonsalves e Stephanie Ramirez são verdadeiro um mimo, com papel a imitar o antigo onde desfilam caligrafias diversas, mapas, esquemas e todo o tipo de maluqueiras que passam pela cabeça destes diaristas desvairados. Um dos livros mais castiços que chegaram às livrarias este ano, absolutamente obrigatório para os fãs de Gravity Falls.
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