Quando, em 2013, o Planeta Tangerina foi eleito a “melhor editora europeia para a infância“, muito boa gente apanhou o primeiro foguetão que encontrou, entre o conforto e os mimos da 1ª classe e os trocos de um qualquer low cost, para conhecer de perto este planeta muito dado à literatura infantil. Para além dos habituais recuerdos, os visitantes puderam confirmar a excelência, a dedicação e a finesse que cada um dos livros saídos deste astro recebe, cada um deles com uma luz muito própria.
A verdade é que, como dizem os nossos irmãos do outro lado do Atlântico, O Planeta não se deitou à sombra da bananeira e, desde então, tem continuado a publicar livros tão incríveis como os guias “Lá Fora” e “Cá Dentro” – o primeiro, uma incrível enciclopédia naturista que mostra aos mais novos um mundo cada vez mais escondido dos seus olhos, e que os impulsionará a saltar os muros de cimento rumo a territórios mais verdejantes; o segundo, uma viagem muito curiosa ao órgão mais esponjoso do corpo humano, e aquele onde tudo acontece -, uma agenda incomum com o título “Um Ano Inteiro” – ideal para explorar a natureza e que poderá ser começada em qualquer dia do ano (e num ano qualquer) -, ou a colecção Dois Passos e Um Salto, dedicada a um público mais crescido – da qual fazem parte, entre outros, o fabuloso “Irmão Lobo” ou a BD de fim de adolescência intitulada “Finalmente o Verão”.
Este ano, chegou às livrarias portuguesas mais um projecto com o selo do Planeta Tangerina, intitulado “Atlas das Viagens e dos Exploradores” (Planeta Tangerina, 2018), que nos mostra, como indica o sub-título, “as viagens de monges, naturalistas e outros viajantes de todos os tempos e lugares“.
Resultado de uma colaboração entre Isabel Minhós Martins (textos) e Bernardo P. Carvalho (ilustrações e design gráfico), o Atlas lança desde logo uma pergunta pertinente, numa era dominada pela tecnologia: “Ainda conseguimos imaginar um mundo sem mapas (e um mundo sem os outros)?”.
Vivia-se, nesses tempos iniciáticos onde o mundo não tinha sido capturado num desenho à escala, num espaço sem limites, onde a par da carta branca à imaginação imperava, também, o mundo do desconhecido, bem como do não-regresso de viagens que como garantido tinham apenas a incerteza. Os primeiros mapas desenhados pelo homem, onde se incluíam imensas áreas em branco, foram capazes de despertar o formigueiro nos mais curiosos, tornando-se alguns deles exploradores.
Depois de uma dissertação sobre as razões que levam as pessoas a fazerem-se à estrada, as particularidades e os atritos das grandes viagens dos primórdios da exploração ou uma nota sobre as mulheres exploradoras, é explicado ao leitor os critérios que levaram à escolha dos 11 exploradores que o Atlas se propõe dar a conhecer:
“Para conseguirmos uma maior representatividade, seleccionámos exploradores de várias épocas e países e, apesar de estarem presentes em número menor, (…) incluímos também mulheres exploradoras. Preocupámo-nos em escolher expedições ou viajantes que tenham revelado maior respeito pelas pessoas,pelas culturas e pela natureza que encontravam. Não podemos esquecer, porém, que os exploradores viviam num contexto, ou seja, inseridos numa época e numa sociedade com os seus valores e formas de pensar.”
E quem são, então, estes 11 eleitos, apresentados segundo a linha cronológica do tempo? Pytheas, que se atreveu a passar para lá do estreito de Gibraltar em busca da fonte do estanho, um dos metais mais usados na época; Xuan Zang, que decidiu viajar até à Índia depois de encontrar contradições nos textos sagrados budistas; Del Carpini, que empreendeu uma viagem aos 60 anos por encomenda do Papa de então; Marco Polo, que juntamente com o pai Niccolo e o tio Matteo empreendeu viagens motivado pelo comércio e a busca de fortuna; Ibn Battuta, que saiu de casa aos 21 – não para comprar cigarros – e apenas regressou aos 50 – e que é considerado “o maior viajante de todos os tempos“; Bartolomeu Dias, que teve de lutar contra as histórias assustadoras e monstros lendários como o Adamastor; Jeanne Baret, a primeira mulher da história a dar a volta ao mundo; Joseph Banks, cuja expedição foi considerada uma das maiores aventuras de sempre, e que tinha como missão inicial pesquisar e recolher espécies; Humboldt, que viajou até à América do Sul para recolher informações sobre o novo continente, levando na bagagem todo o tipo de instrumentos científicos; Charles Darwin, que de caso perdido aos 12 anos se veio a tornar um dos nomes mais importantes da Ciência; e Mary Henrietta Kingsley, que viajou sozinha até à África Ocidental, escrevendo livros que contribuíram para mudar a visão que os europeus tinham sobre os povos africanos.
Para cada um dos exploradores há uma pequena sinopse da viagem devidamente enquadrada no tempo, uma breve apresentação ao estilo de CV, algumas curiosidades, um mapa com os diversos pontos de passagem da viagem, os motivos da viagem e o que aprendemos com ela e excertos dos escritos que deixaram sobre as suas viagens. Tudo adaptado para os leitores mais jovens, recorrendo à simplificação dos percursos dos mapas, à adaptação das citações e recorrendo a ilustrações a negro, com um toque naturalista e o espírito old school, intercaladas com outras onde a cor explode ao primeiro olhar. Os mapas, esses, são uma delícia. Mais um livro essencial para a pequenada que, nesta era onde tudo se conhece antes da partida, recupera o sentimento primário e a ânsia da viagem. Se não for o livro infantil do ano vai andar lá perto.
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