No passado sábado, o Deus Me Livro rumou à margem sul do Tejo: o bonito Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal celebra 25 anos e, para fazer a festa, pediu ajuda aos Dead Combo, que andam em digressão pelo País com o mais recente álbum de originais, “Odeon Hotel”.
O disco marca uma nova fase na carreira da banda: assinaram por uma major, a Sony Music, e entregaram a produção ao chileno Alain Johannes, antigo membro dos Queens of The Stone Age e habitual comparsa de Josh Homme nas gravações. No Seixal, os Dead Combo apresentaram-se com cinco elementos: Pedro Gonçalves e Tó Trips à cabeça, António Quintino no contrabaixo e teclas, Alexandre Frazão na bateria e Gui no saxofone.
Cheia até às costuras, a sala foi brindada com um excelente concerto, com foco nas músicas do novo álbum, sem esquecer as mais antigas. A abrir, três temas de “Odeon Hotel”: a enérgica Deus Me Dê Grana, seguida de Mr & Ms. Eleven e The Egyptian Magician. No ecrã gigante atrás da banda surgia então o letreiro garrafal do “Odeon Hotel”.
Tó Trips, o homem da cartola, apresentou-se de camisa preta e fato vermelho sangue – um personagem saído de um filme de Tim Burton. Trips é um entertainer, o proverbial animal de palco, e tocou com uma intensidade assombrosa, corpo feito de ângulos improváveis, qual mafarrico endiabrado. Um dos grandes momentos da noite foi dele, na sentida interpretação de Esse Olhar que Era Só Teu.
Atrás da bateria, Alexandre Frazão era o epicentro deste terramoto: foi uma máquina infernal, roubando a atenção com o seu virtuosismo e inventividade. Foi assim em Lisboa mulata, tocado por Frazão, Trips e Pedro Gonçalves, um frenético Power Trio que levou o público em crescendo até à loucura – no melhor sentido.
Muito bem-disposto, Gui, histórico saxofonista dos Xutos, trocava sorrisos com os seus companheiros – há uma grande cumplicidade entre os músicos, e isso nota-se em pequenos pormenores: o diálogo entre o mellotron de Gui e a bateria de Frazão no final de Dear Carmen Miranda, por exemplo, ou os olhares cúmplices entre Tó Trips e Frazão, em constante despique.
Com um discreto carisma, Pedro Gonçalves passeou uma presença sempre cool. De vez em quando atravessava o palco de forma quase felina, para trocar de instrumento com António Quintino, músico versátil atrás do contrabaixo, dos teclados do mellotron ou do curioso theremin, tocado com a mão suspensa no ar junto a uma espécie de antena.
Durante o espectáculo, os músicos usaram os mais inesperados sons como matéria musical: baquetas a cair por cima da bateria, moedas a rolar na parte de trás da guitarra, cordas fustigadas com pratos de bateria: valeu tudo em nome da música.
Em palco foram visíveis as cores primárias da paleta musical dos Dead Combo: a américa latina em Rumbero, Cuba 1970 e In a Mellotron (“música para gajos com piscina em casa”, dizia Tó Trips sobre esta última); o acelerado rock do deserto tingido com ritmos africanos em Desassossego e A Bunch of Meninos; a figura tutelar de Carlos Paredes em Faduncho; e o jazz fumarento em Lusitânia Playboys. Esta última contou com uma engraçada história de Tó Trips sobre dois gajos de Lisboa e o seu encontro com duas bifas num bar do Cais do Sodré.
São um caso sério na música nacional e, ao vivo, ainda se destaca mais a sua refrescante originalidade – com concertos deste calibre, o céu é o limite para os Dead Combo.
Galeria Fotográfica (Fotos de Luís Miguel Andrade)
Sem Comentários