Houve uma altura, ali mais ou menos depois de Os Mutantes, em que Teresa Villlaverde parecia ser a ponta-de-lança titular da selecção cinematográfica portuguesa, fazendo dupla com o Pedro Costa. Não é que tenha desaparecido das convocatórias, mas as suas exibições (leia-se filmes) tornaram-se mais inconstantes. Especialmente depois de Trance, filme que coleccionava todas as tragédias do mundo e as atirava sobre os ombros da Ana Moreira, que andávamos a precisar de nos conciliar com a sua arte de jogar.
“Colo” poderá ainda não ser esse filme, mas já nos volta a fazer acreditar que Villaverde pode e deve vir a reclamar novamente a sua titularidade na equipa cinematográfica de todos nós muito em breve. É um filme que se inscreve nesta espécie de cinema da troika, trabalhos sobre a crise e sobre um país em falência que têm surgido nos últimos anos como rescaldo da crise financeira de 2012 e respectivas políticas de austeridade, onde se inscrevem também “São Jorge”, “A Fábrica de Nada” ou a trilogia de “As Mil e Uma Noites”.
Temos então uma típica família da clásse média – pai (João Pedro Vaz), mãe (Beatriz Batarda) e filha (Alice Albergaria Borges) -, num subúrbio de Lisboa, que está prestes a desmoronar-se. O pai não tem trabalho, a mãe acumula empregos e a filha vai crescendo por entre aquele ambiente disfuncional. “Colo” é um filme em perda, que vai entrando em falência aos poucos e poucos – o pai a comer um hambúrguer que encontra no chão, a filha a andar de autocarro sem pagar porque não tem dinheiro para o passe… -, até que a electricidade é cortada e ficamos às escuras. E as cenas em casa, à luz das velas e com a luz recortada, fazem lembrar o cinema de Pedro Costa, que também rima com este, o quarto da Vanda ou o apartamento do Ventura.
“Colo” não é uma história de denúncia ou de resistência (como também o era, por exemplo, “A Lei do Mercado”, outro trabalho sobre a desumanização do capitalismo), mas antes um filme de um realismo social onde Teresa Villaverde já não está tanto do lado dos jovens, como em “Os Mutantes” ou “Três Irmãos”, assumindo uma idade mais madura. Mas tem força e intensidade suficiente para fazer das tripas coração e compensar os momentos mais baixos, num percurso inconstante feito de altos e… baixos, salvo a redundância. E, no final (que é um terceiro acto desnecessariamente longo), quando tudo se transforma e até há uma avó que não reconhece a neta, lembramo-nos de outro filme português, “O Ornitólogo”, que no final transformava tudo, incluindo o próprio actor. Filme curioso este “Colo”.
Texto originalmente publicado em Royal With Cheese
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