Tem nome de arquipélago caribenho, mas não é de ilhas tropicais que trata este texto – o nosso destino é Toronto, no Canadá: Bahamas é o alter-ego do guitarrista e compositor canadiano Afie Juvanen. O músico acaba de editar “Earthtones”, (Island Records, 2018), quarto álbum de originais, no seguimento de uma carreira com algum reconhecimento crítico desde a estreia – o disco “Pink Strats”, de 2009.
“Earthtones” é, no entanto, um animal diferente. Confrontado com alguma paralisia criativa na altura de gravar novos temas, Afie ensaiou uma abordagem distinta – enviou um mail a Pino Palladino e a James Gadson para saber se estariam interessados numa colaboração. E quem são estas ilustres figuras? Nada menos que a experiente secção rítmica que trabalhou com o americano D’Angelo em “Black Messiah” – uma espécie de álbum-fetiche para Afie.
Em grande parte gravado numa sessão de estúdio de três dias em Los Angeles, “Earthtones” deve muito da sua sonoridade aos veteranos Palladino e Gadson. O baterista e o baixista respiram funk e R n’B por todos os poros, carregando o disco com baixos profundos e batidas borbulhantes.
A qualidade da produção, a cargo de Robbie Lackritz, também salta à vista: tudo soa bem, desde os arranjos espaçosos até à guitarra cristalina de Christine Bougie, passando pelos coros afinados de Felicity Williams e pelas letras espirituosas e directas de Juvanen. O resultado é um disco minimal, descontraído e fascinante em igual medida.
O timbre vocal de Juvanen lembra o de um Bill Calahan cruzado com a boa onda surfista de Jack Johnson (para quem Bahamas já abriu concertos). Na mistura, a voz aparece sempre em destaque, à frente dos instrumentos. Além de uma excelente voz, o músico tem também um bom ouvido para melodias viciantes – ouça-se “The Opening Act (The Shooby Dooby Song)” e veja-se como, em duas penadas, já estamos a abanar a cabeça ao som da música.
Antigo guitarrista de Leslie Feist, Bahamas é um artista completo, com influências que vão de Neil Young a Kendrick Lamar. Em “Bad Boys Need Love Too” percebemos porque é que Afie se diz apaixonado pelo hip-hop e R n’B – “É o género musical onde estão a acontecer todas as coisas importantes”, disse em entrevista recente à Billboard.
Há ainda em “Earthtones” toneladas de sensibilidade pop – veja-se “No Depression” e “Everything to Everyone”, relaxadas melodias de verão nascidas fora de tempo, no pico do inverno. Mas nem só de optimismo se faz este disco. Ao nível das letras há algum desalento latente, que se ergue à superfície em temas como “So Free” – “Old Ways, long days / Lost inside my own maze”.
Incapaz de permanecer espartilhado pela sonoridade dos primeiros discos, Bahamas avança neste álbum para um patamar mais elevado. Ainda que sites de referência indie como a Pitchfork ou o Stereogum não lhe dêem grande espaço, a sua trajectória é ascendente – não será por acaso que Taylor Swift incluiu “Way With Words” numa recente playlist de músicas favoritas. Valerá a pena acompanhar os próximos tempos deste talentoso artista, espécie de anti-herói melancólico, condenado a disfarçar a solidão com um arsenal de boas vibrações.
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