Shahryar Mazgani chegou a Portugal com apenas cinco anos. A sua família deixou para trás as convulsões da revolução islâmica em Teerão, em 1979, trocando-as pela pacatez da cidade de Setúbal.
Mazgani tem percorrido os trilhos da composição musical desde 2005 – foi o ano em que foi considerado pela influente revista francesa “Les Inrockuptibles” um dos 20 melhores novos artistas europeus. Os seus temas apresentam, em igual medida, uma sensibilidade pop alternativa, conjugada com uma linguagem de autor, literária e lunar.
Com um currículo musical de assinalável consistência, o músico é hoje em dia uma peça destacada no tabuleiro da música nacional. Apresentou em Setembro de 2017 o seu quinto álbum de originais, “The Poet’s Death”, dedicado a um herói pessoal de sempre: o poeta-cantor Leonard Cohen, extraordinário escritor de canções, falecido em 2016. É, aliás, assumida a inspiração em Cohen e em outros autores anglófonos como Nick Drake, Tom Waits ou Nick Cave.
Há na música de Mazgani uma imagética que remete para geografias americanas, uma mescla de blues, folk e pop – algumas canções têm o cheiro de corredores de madeira escura, outras evocam espaços abertos e noites estreladas traçando horizontes largos.
Pode parecer taciturno à superfície, mas uma audição mais atenta de “The Poet’s Death” revela um certo sentido de assombro, de esperança, a roçar a prece – veja-se a beleza tranquila de “The Faintest Light”, com um registo que lembra os Spain de Josh Haden, uma sentida canção de embalar envolta em delicados arranjos de cordas.
O timbre particular de Mazgani contém uma energia que se constitui como o nervo central das canções. São composições elegantes, assentes em instrumentações sofisticadas, com espaço para a respiração do silêncio. O álbum foi co-produzido por Peixe – alter-ego de Pedro Cardoso, antigo guitarrista dos Ornatos Violeta – e impressiona pelo som cristalino e sedutor, quase jazzy, de temas como “Send The Word” e “Breath of Gold”. Noutros pontos surge a centelha de energia do rock, sem perder de vista o bom gosto – como na guitarra à la PJ Harvey do viciante “The Traveler”, ou na injecção de blues do tema-título, “The Poet’s Death”.
“A poesia é apenas uma prova de vida”, disse um dia Leonard Cohen, “se a vida está a arder bem, a poesia é apenas a cinza”. Celebremos então a fértil combustão de Shahryar Mazgani.
Na sequência da tour de apresentação de “The Poet’s Death”, o Centro Cultural de Belém recebe o cantor no próximo dia 3 de Fevereiro, integrado na programação do CCBeat. Uma oportunidade para testemunhar o bom momento do músico luso-iraniano.
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