Quem matou Roland Barthes? É esta a questão levantada por Laurent Binet em “A Sétima Função da Linguagem” (Quetzal, 2017), um livro onde, por entre uma intrincada e delirante investigação policial, se diverte a satirizar o meio intelectual francês dos anos 80, bem como a dar umas valentes alfinetadas em algumas figuras políticas francesas desse mesmo período.
Estamos a 25 de Fevereiro de 1980. Roland Barthes, reputado linguista, filósofo e crítico literário, é atropelado por um veículo de transporte de uma lavandaria, quando saía de um almoço da casa de Mitterrand, ficando gravemente ferido na cabeça e nos pulmões, sendo depois induzido a uma traqueostomia. Barthes acabaria por morrer um mês depois, aos 64 anos, sucumbindo a uma infecção generalizada.
Partindo deste acontecimento, Laurent Binet escreveu um romance que arranca de uma premissa: e se, ao invés de um acidente, se tivesse tratado de um homicídio? No livro, caberá ao Comissário Jacques Bayard, juntamente com um professor de Semiologia chamado Simon Herzog, conduzir um inquérito com uma grande dose de absurdo, na tentativa de descobrirem, se os boatos estiverem certos, o documento pelo qual Barthes foi morto, e que se debruça sobre a sétima função da linguagem, que daria a quem dele se apoderasse os mais incríveis poderes de persuasão através da simples oralidade.
Durante a investigação, Bayard e Herzog irão interrogar os mais afamados intelectuais de Paris e mais além, como Julia Kristeva, Philippe Sollers, Lacan, Althusser, Jacques Derrida ou Michel Foucault, lendo-se a certa altura um desabafo que é como que uma seta envenenada apontada a um cérebro colectivo: “Pobres pequenos pensadores franceses encerrados na vossa visão de um mundo que se reduz à esfera íntima mais mesquinha, mais convencional, mas banalmente egocêntrica“.
O livro tem igualmente uma faceta linguística, apresentando quase uma pequena história da Semiologia e das suas diferentes versões e protagonistas, ainda que, a certa altura – e talvez por tantos intelectuais passarem por aqui -, entre também um pouco no registo armado aos cucos que pretendia, de certa forma, satirizar.
Mas nem só de intelectuais dados às letras se alimenta esta recambolesca história de Binet. Encontramos também gente do cinema – como Antonioni ou Monica Vitti -, espiões, sociedades secretas, a máfia italiana, as brigadas vermelhas, um clube literário onde Cícero compete com Maquiavel, constantes referências ao Ténis, numa visita a cidades como Paris, Bolonha, Ithaca, Veneza e Nápoles.
Mitterrand e Giscard competem entre si pela pior prestação, sendo talvez Giscard aquele que sai de cena com o maior número de apupos: “Um presidente fascista à cabeça de um estado policial“.
Para além de Bayard, o comissário que vai alimentando a trama com um lote razoável de comentários mordazes e ironia em modo de bar aberto, o livro vive sobretudo da personagem de Simon Herzog, um jovem professor de Semiologia que irá, na vida real, assumir os signos à volta do agente 007, com que vai enfeitiçando os alunos na sala de aula.
Laurent Binet estará presente na edição deste ano do Folio, que se realizará entre os dias 19 e 29 de Outubro.
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