“Para o Fracassus, o divertido é a vitória. Para o Fracassus, a diversão é a guerra.”
Em Novembro de 2016, Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos da América. A notícia dividiu opiniões pelos quatro cantos do mundo — enquanto uns se regozijavam, outros ficavam incrédulos. Independentemente das reacções, meio ano depois, o lado polémico do agora presidente de uma das maiores potências do mundo não passa despercebido.
Como resposta à vitória eleitoral de Trump, Howard Jacobson — vencedor do Prémio Man Booker de 2010 com a obra “A Questão Finkler” — escreveu “Pussy” (Bertrand Editora, 2017), um conto de fadas pleno de humor no qual procura, de forma fantasiada, perceber de que forma Trump conquistou “o coração e o voto do seu povo”.
Ainda que nunca fazendo referência directa a Donald Trump, o autor representa-o pela personagem “Fracassus”, o presunçoso herdeiro do Grão-Ducado de Origen, república de Urbs-Ludus, famoso pelos seus arranha-céus e casinos dourados. Desde a infância até à assunção do reino, acompanhamos a evolução daquele para quem “desejar equivalia a receber”. “Não se esperava que um Príncipe desse sinais de intelectualidade, mas não era este príncipe mais lerdo do que o significado costumeiro da palavra?”.
Numa crítica sagaz à personalidade do líder, Howard Jacobson põe a nu, de forma caricaturada, como aquela que parece ser a última pessoa capaz de liderar a nação acaba a fazê-lo. Marcado por uma infância a ver reality shows na televisão, a imaginar-se o imperador romano Nero e a fantasiar com profissionais do sexo, Fracassus é descrito como “uma criança de pugnacidade, egocentrismo e fanfarronice comuns, pouco atenta ao mundo em redor e habituada a que lhe fizessem as vontades”.
A sátira é constante na obra, tanto no que se refere a Fracassus — cujo choro quando algo lhe era negado era entendido como demonstrativo da sua determinação e o facto de não reparar em ninguém um “sinal de autossuficiência e de uma vida interior de grande riqueza” — como à política e à sociedade em geral.
Desde as selfies da moda, aos blogues e ao uso do Twitter — primeiro para relatar o que come e, mais tarde, para partilhar os seus pensamentos sobre o mundo —, o leitor encontra a discussão da bomba como uma oportunidade, um príncipe com receio de discursos com mais de 140 caracteres, dado o número limitado de palavras que conhece para se expressar, e uma sociedade em que o ecrã substituiu “a chupeta como apaziguador e o berço portátil como soporífero”.
Howard Jacobson apresenta-nos tragédia e comédia de mãos dadas, através de uma anedota política, uma sátira que tem tanto de divertida quanto de preocupante, com um tom provocatório permanente. Afinal, parece que “o segredo de um bom governo é não cumprir promessas”. Caberá ao leitor decidir se se revê na crítica, mas o autor deixa logo de início um presságio: “E chegará o momento em que todos aqueles que habitam sobre a Terra se espantarão por o terem adorado…”
2 Commentários
muito legal seu conteudo parabens pelo seu site 🙂
Outro fim do mundo é possível.