A resiliência dos ingleses ficou bem impressa nas páginas da História, sobretudo quando o período de que falamos é a Segunda Guerra Mundial. Talvez seja por este motivo que Christopher Nolan decidiu retratar a batalha de Dunquerque, que decorreu entre 25 de Maio e 4 de Junho de 1940. Uma boa parte das forças britânica e francesa foi encurralada por uma divisão alemã no nordeste da França, tendo mais de 300 mil soldados sido evacuados por via marítima.
Contudo, não é no mar que “Dunkirk” começa; Tommy (Fionn Whitehead) corre pelas ruas sob uma chuva de balas, vendo os companheiros de armas a ser atingidos um a um. Só mesmo por acaso não teve a mesma sorte, acabando por chegar à praia onde as tropas aliadas se encontravam pouco tempo depois. Juntamente com outro soldado (Aneurin Barnard), transporta um ferido numa maca em direcção a um navio-hospital, sendo ambos expulsos da embarcação minutos antes de se afundar.
O mar é simultaneamente uma saída rumo à salvação e um lugar onde moram todos os perigos, já que os pilotos da Royal Air Force pouco podem fazer face aos constantes bombardeamentos do inimigo. Um deles, Jack Lowden, acaba mesmo por ser resgatado depois de ver o seu Spitfire a mergulhar nas águas gélidas do Canal da Mancha, restando apenas Tom Hardy para defender os compatriotas. Perante a falta de meios, dá-se início a uma operação de resgate que ficou célebre: é feito um apelo a todos os marinheiros civis para que atravessem o Canal nas mais diversas embarcações – desde barcos de pesca a iates de luxo – de modo a trazer os soldados de volta a solo britânico.
A “Operação Dínamo”, tal como ficou conhecida a evacuação de Dunquerque, mobilizou inúmeros heróis anónimos, cuja disponibilidade salvou milhares de soldados da morte certa. Entre estes heróis, encontramos o Capitão Dawson (soberbo Mark Rylance), que não hesita em dirigir-se para o nordeste da França escassas semanas após ter perdido o filho mais velho durante um combate aéreo. É precisamente no momento da chegada destes civis que “Dunkirk” atinge o seu momento mais glorioso, deixando um intrépido oficial da Marinha (Kenneth Branagh) à beira das lágrimas. A magnífica banda sonora, assinada por Hans Zimmer (por sinal, um compositor alemão), imprime dramatismo à cena.
“Dunkirk” vive sobretudo de expressões faciais e de actos – não tanto de diálogos, que são escassos. Porém, nada disto retira densidade ao filme, bem pelo contrário; até Harry Styles, mais conhecido por ser membro da banda britânica One Direction, retrata com eficácia o medo que qualquer soldado tem de dar o peito às balas, sendo que uma guerra também é com frequência sinónimo de cobardia. Cobardia essa que dá origem a um sentimento de vergonha no regresso a casa, já que se tem a consciência de que nem sempre se fez o melhor pela pátria.
No entanto, muitas vezes aquilo que se fez já é mais do que suficiente, razão pela qual ouvimos as palavras de Churchill através da boca de Tommy; o famigerado discurso onde o Primeiro-Ministro declara “Nunca nos renderemos” serve de mote para tudo o que virá a seguir – até à vitória dos Aliados. Vitória que nunca seria possível sem o contributo destes homens anónimos em terra, no ar e no mar. Nolan fez um grande filme sobre estes pequenos paladinos da justiça e afirma-se como um dos melhores cineastas da actualidade.
“Se estiveres a atravessar o inferno, não pares”, terá dito Churchill durante a Segunda Guerra. Foi o que estes homens fizeram, numa imensa lição de bravura. Porque o teatro de guerra não é para mariquinhas.
1 Commentário
Só tenho lido coisas boas sobre este filme. mas sem dúvida o seu texto é o melhor que li e fez-me mesmo vontade de ver o filme. Este fim de semana trato disso e parabéns pelo blog 🙂
Bitaites de um Madeirense