“Pastoralia” (Antígona, 2017), de George Saunders, reúne seis contos publicados originalmente na New Yorker, pela qual foi considerado, em 2002, um dos melhores escritores com menos de 40 anos.
No conto que abre o livro, Pastoralia, observamos as condições de trabalho, e como este dá sustento a uma vida que se não vive. Um homem e uma mulher vivem num parque de diversões temático, as Atracções Remotas, onde imitam o quotidiano da vida nas cavernas. Esta – e também a contabilidade geral da empresa – exige grunhir, catar bichos, desenhar hieróglifos e nunca mostrar-se ser um ser humano contemporâneo.
No Carvalho do Mar, um bairro onde voam balas e vivem uma tia alegre, três sobrinhos desgraçados e dois bebés, o trabalho é a salvação. Depois da morte da tia, e com ela morta sentada no sofá, há um plano para mudar de vida: aprender a cozinhar para se ser mais saudável, ganhar mais dinheiro num clube de striptease para cursar direito, evidenciar o peito para arranjar um posto de trabalho.
Há ainda os que procuram a salvação para uma vida insossa, como Neil Yaniky, que se imagina com uma esposa atraente e um Mercedes, mas vive com a sua irmã mais velha, uma mulher pueril, desgrenhada e fanática de Deus, de quem se quer livrar. Ou a história de Mickey, um barbeiro bem-sucedido à procura da mulher ideal que aceite o coto dos seus pés. Há os que não têm salvação, e viver é provar que o mal está sempre à espreita – apenas precisa de encontrar a vítima perfeita e os palermas ajustados. O pior é sempre possível, a esperança também.
Saunders coloca o leitor ao lado das personagens, sabemos tanto quanto elas, surpreendemo-nos como elas, e acreditamos que a vida possa ter acontecimentos extraordinários, embora raramente.
Com prefácio e tradução de Rogério Casanova, “Pastoralia” é um livro de um humor negro comovente, e George Saunders mostra-se exímio no jogo da ironia. Vale muito a pena ler.
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