Foi a “Ode Triunfal” (Clube do Autor, 2016) que marcou o nascimento, em Pessoa, de Álvaro de Campos. Um poema de auto-transformação de um heterónimo que, como diz Richard Zenith no posfácio, “vibrava com as máquinas e a vida urbana ao mesmo tempo que se retorcia, no seu íntimo, com ânsias e angústias“.
Esta nova edição do Clube de Autor com ar de livro infantil conta, para além da tradução e posfácio de Zenith, com desenhos de Pedro Sousa Pereira, para além de uma edição bilingue português/inglês.
“Eu podia morrer triturado por um motor
Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída.
Atirem-me para dentro das fornalhas!
Metam-me debaixo dos comboios!
Espanquem-me a bordo de navios!
Masoquismo através de maquinismos!
Sadismo de não sei quê moderno e eu e barulho!”
Escrito em Londres no ano de 1914, “Ode Triunfal” corresponde ao que muitas vezes se designa como o “período frenético” de Fernando Pessoa que, nesse ano – nomeadamente no dia 8 de Março -, terá escrito “O Guardador de Rabanhos” de um só fôlego – através do heterónimo Alberto Caeiro -, com 30 poemas redigidos num sopro como se em estado de possessão.
Um facto que se veio a provar um pouco fantasioso, algo habitual quando entramos na vida de Fernando Pessoa – uma vez que os poemas foram escritos em vários dias e sofreram, ao contrário da lenda, várias alterações. Ainda assim, pouco tempo depois surgiram também os seis poemas de “Chuva Oblíqua”, atribuídos a Ricardo Reis, bem como, escrita à máquina de escrever “sem interrupções nem emenda” – palavras do próprio Pessoa -, esta “Ode Triunfal”. Palavras que entram, também, no território do mito Pessoano, uma vez que há também um rascunho manuscrito, versos alterados e outros acrescentos. Mário de Sá-Carneiro, amigo quase umbilical de Pessoa, leu-o ainda sem título.
Não deixando de conter alguma ironia e sarcasmo, “Ode Triunfal” evoca a urbanidade, a tecnologia e as sensações que estas podem provocar, fazendo deste poema a apologia do sentir.
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