Em 1979, Kit Williams escreveu um livro chamado “Masquerade” onde, paralelamente à história que corria no papel, lançou uma verdadeira caça ao tesouro onde, quem tivesse a felicidade de cavar no sítio certo, deitaria as mãos a uma jóia de ouro de 18 quilates, enterrada algures no Bedfordshire Park, em Londres.
A caça acabou por se tornar um pequeno escândalo, uma vez que, quem esteve mais perto de lhe deitar as mãos, era namorado de uma antiga namorada de Williams, e parece que tinha chegado à sua localização pela chamada porta do cavalo. A solução para o puzzle apenas seria revelada em 2009, tendo a peça sido levada a leilão e arrebatada pela módica quantia de 31900 libras, tendi sido exibida no V&A Museum, em Londres, como parte da retrospectiva British Design 1948-2012, que teve lugar na capital inglesa em 2012.
Cerca de trinta e cinco anos depois, James Frey e Nils Johnson-Shelton decidiram recuperar a ideia de caça ao tesouro literária com uma trilogia a que deram o nome de Endgame. Para os leitores que decidirem partir rumo à decifração de códigos, puzzles e adivinhas, a recompensa está ao nível de um pequeno Euromilhões. No total, estamos a falar de qualquer coisa como 3 milhões de dólares. “A chamada” (Editorial Presença, 2014), o primeiro livro da série, esconde as pistas para uma chave que irá abrir um cofre no Ceasers Palace, em Las Vegas, com ouro no valor de 500 000 dólares. Mas estará a obra ao nível da recompensa?
A história reza mais ou menos assim. Há 12 mil anos atrás, os extraterrestres chegaram à Terra e criaram a humanidade. Dado que precisavam de uma grande quantidade de ouro – para fins desconhecidos – construíram as primeiras civilizações humanas, compostas por doze linhagens distintas, que teriam a missão de o extrair da terra. Quando a febre de ouro foi acalmada fizeram-se aos céus, mas não sem antes deixarem um aviso: um dia iriam voltar e, nessa altura, jogar-se-ia o Endgame.
Ao longo de dez mil anos, as doze linhagens originais existiram em segredo, mantendo sempre – cada uma delas – um jogador preparado para entrar em acção. Geração após geração foi-lhes ensinada a mestria das armas, das línguas, da estratégia, do disfarce e do assassínio. Até que a chamada tem lugar.
Endgame tem uma costela arrancada aos Jogos da Fome – que por sua vez tinha arrancado duas costelas ao livro nipónico Battle Royale: apenas um dos doze jogadores pode sobreviver, salvando-se a si próprio e à linhagem pela qual combate. Para isso terá de encontrar três chaves escondidas algures no planeta, sendo que “A chamada”, o primeiro livro da trilogia, está centrado na busca da primeira chave, servindo de cartão de visita às personagens principais.
À semelhança dos Jogos da Fome fazem-se alianças, deixam-se amores para trás e descobrem-se novas paixões, variando também a motivação e o ângulo com que cada jogador decide olhar para o tabuleiro. Enquanto uns seguem a veia maquiavélica, outros há que procuram descobrir uma falha no sistema, uma regra não identificada que impeça o extermínio das onze linhagens que não vencerem o jogo.
Se as semelhanças em termos de estrutura são algumas em relação aos Jogos da Fome, já quanto à composição da narrativa a história é bem diferente. Em Endgame o foco está todo centrado na acção, assemelhando-se muitas vezes a um guião para um filme com frases a lembrar telegramas. Por exemplo: “O Peugeot 307 está pronto. Sarah e Jago vão sair de Mossul na manhã seguinte. Estão sentados em extremidades opostas do divã. A televisão está desligada.” Ou seja, pouca poesia e muita matemática, poucas divagações e um apurado sentido prático. Como se de um jogo se tratasse. Curiosamente, está também a ser trabalhada uma adaptação cinematográfica, o que significa que o guionista, sorte a dele, terá muito pouco que fazer – ao contrário do leitor, que tem pela frente uma missão feita para o Tom Cruise. Está aberta a caça ao tesouro.
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