Christine Clark é um 7 na escala das cores dos negros. Quando se ri, as pequenas e perfeitas dentuças, no seu rosto moreno-escuro, reluzem. Como uma oreo, a bolacha.
“Oreo” (Antígona, 2016) é uma miúda especialista-espacialista-feminista. Defende qualquer miúda em apuros e pune os incautos com golpes de artes marciais afro-iídiche-cognitivos suficientemente eficazes para colocar qualquer palhaço no seu circo.
Esta é a história de Oreo e da sua família (a materna afro-americana, a paterna judaica), um caldo de pequenas excentricidades que vão saltando ao longo do livro. A sátira, o humor, as expressões iídiches ou hebraicas e as fórmulas matemáticas para descrever a realidade, tornam este um livro singular.
O anúncio do casamento da mãe de Oreo, Helen, com o seu pai, Samuel, provoca a morte da avó paterna e a paralisia do avô materno. A avó morre no primeiro parágrafo e o avô desparalisa a meio do livro, quando Oreo vai para Nova Iorque. Após o divórcio dos pais, “que discutiam às segundas e às quintas-feiras”, Helen parte em digressão (é actriz), Oreo e o irmão Jimmie C. ficam os avós, Louise – que enlouquece a vizinhança com os seus cozinhados – e James – o avô paralisado que serve de brinquedo quando o chão está impecavelmente encerado. Chegada a maioridade, Oreo é incentivada pela mãe a procurar o rasto do seu pai, Oreo-Teseu. Começa então a aventura de Philadelphia até Nova-Iorque, entre um viajante homossexual, anões com fetiches por cães, prostitutas-mores-e-adjuntas de um chulo de segunda e alguma pancadaria. Inteligente e da boa.
Este é o primeiro e último livro de Frans Ross, publicado em 1974, que passou quase despercebido. Segundo Harryette Mullen, que em 2000 trouxe de novo “Oreo” ao público americano, Ross é uma das escritoras cujo trabalho foi inovador entre as mulheres afro-americanas. Demasiado inovador para o seu tempo. A publicação foi um blip no radar rapidamente desaparecido. A pouca receptividade do mesmo na altura deveu-se, segundo Mullen, ao facto do livro satirizar quer a cultura afro-americana quer a cultura judaica, podendo ter sido ofensivo para os seus leitores. Um livro entusiasmante, divertido. Um jogo sobre e com a linguagem que merece muitos blips.
Fran Ross (1935-1985) cresceu em Filadélfia, estudou Comunicação, Jornalismo e Teatro. Em Nova Iorque foi jornalista e revisora. Mudou-se para Los Angeles onde escreveu textos de comédia para o Richard Pryor Show.
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