No universo da BD, o nome Ed Brubaker já se tornou sinónimo de policial noir ou hard-boiled. O autor norte-americano tem vindo a travar um percurso de valor dentro do género, com títulos como “The Fall” (IDW), “Sleeper” (Wildstorm), “Criminal” (Icon) ou “Incognito” (Icon) – estes três últimos desenvolvidos em parceria com Sean Phillips também. Dentro do universo dos Super-Heróis, manteve o seu estilo característico com tramas policiais em “Gotham Central” (DC Comics), tendo impressionado com o arco de espionagem “The Winter Soldier”, em “Captain America” (Marvel), o qual foi adaptado ao cinema em 2014 com o mesmo título.
“Fatale” (Image), por sua vez, distingue-se em dois aspectos dos restantes trabalhos do autor. Por um lado, Brubaker opta, em adição ao policial, por enveredar pelo fantástico, mais especificamente pelo horror Lovecraftiano, unindo os dois géneros numa amálgama muito feliz. Por outro, como o próprio nome indica, esta é a história da derradeira Femme Fatale. Não existe noir que se preze que não tenha a sua e, neste caso em particular, Brubaker quis criar a sua versão definitiva, aquela cujos encantos são irresistíveis e cuja vida estará sempre em constante perigo. É uma personagem que se mantém sempre misteriosa, cuja dimensão não é particularmente explorada pelos autores. Porém, é ela a força gravítica desta história, com todas as tramas e personagens a girarem sobre si.
Josephine é o nome desta mulher fatal, uma que tem sido perseguida ao longo de décadas – sem nunca aparentar estar um dia mais velha – por um culto de adoradores de estranhos e tenebrosos deuses. Ao longo destes quatro volumes – já publicados pela G.Floy – vamos conhecendo as suas aventuras ao longo de diferentes períodos da História norte-americana, começando pela corrupção dos anos 50 (volume 1), passando pelos meandros do cinema de Hollywood na década de 70 (volume 2) e acabando na música dos 90, numa Seattle depressiva após o suicídio de Kurt Cobain (volume 4). No volume 3 fazemos uma incursão diferente da dos restantes, onde se reúnem quatro histórias isoladas que servem para explorar a mitologia desta Femme Fatale. É que Josephine não é a primeira encarnação da mulher fatal, outras a precederam datando até uma frança medieval em 1286 ou ao velho oeste americano em 1883. Quanto a Josephine, ficamos a saber que tem sido o avatar da sensualidade, pelo menos desde a grande depressão americana dos anos 30.
Todos estes arcos narrativos vão sendo contados em paralelo com aquele que decorre no presente e que está patente em todos os volumes (excepção do terceiro). No dia em que Nicolas Lash conheceu Josephine, a sua vida, como tantas outras antes, mudou, e o seu fascínio em torno desta mulher, além de inevitável, só lhe trouxe o prometido caos. Nestes quatro volumes seguimos a procura exaustiva de Lash pelo paradeiro de Josephine, ao mesmo tempo que vai tecendo ligações sobre o mistério em seu redor, tudo a caminhar para o clímax que irá encerrar definitivamente esta história no quinto e último volume, com lançamento previsto para Maio deste ano.
Se Josephine não é propositadamente desenvolvida, os autores compensam no retrato mais complexo dos homens que passam pela sua vida. São eles que acabam por ser os verdadeiros protagonistas dos respectivos arcos narrativos, pois são os seus sentimentos e as suas escolhas, por vezes ilógicas, que seguimos de perto. Ao longo destes volumes vamos conhecendo personagens muito distintas, cujo único ponto que as une é a paixão obsessiva por esta mulher. Ao criar esta força da natureza da sensualidade, Brubaker acabou, ao mesmo tempo, por desculpar as acções destes homens que a seguem, eliminando-lhes as responsabilidades sobre as suas escolhas. Felizmente, a influência de Josephine não é sempre soberana, e a experiência que cada um retirou do tempo que passaram juntos cria situações e futuros diferentes.
Cada vez mais, ler Ed Brubaker é ler também Sean Phillips. Escritor e desenhador continuam numa simbiose prolífica, com Phillips a enveredar pelo horror Lovecraftiano com a mesma facilidade que a do seu parceiro. Os seus desenhos são amplos, suaves e a estrutura narrativa simples e muito funcional. O ambiente que pauta as diferentes épocas da América e o terror incutido no culto secreto são captados na perfeição onde, para isso, o trabalho de cor de Dave Stewart e Elizabeth Breitweiser foi fulcral. Mora aqui uma leitura que facilmente apela aos fãs do género, que conta já com cinco nomeações aos Eisners – tendo vencido o de melhores cores pelo trabalho de Dave Stewart.
2 Commentários
Olá! É fácil encontrar os volumes de “Fatale” em Portugal? Moro o Brasil e vivo à caça dessa série.
Olá Marcelo. Sim, por cá é bastante fácil uma vez que finalmente temos edição portuguesa :