Uma carreira promissora, um cineasta a ter em conta que dá novo fôlego ao melodrama europeu. Os elogios tecidos a Piero Messina são cautelosos, quando em comparação com o seu “mestre” Paolo Sorrentino (Messina foi assistente de realização em “A Grande Beleza”/”La Grande Bellezza”) mas, ainda assim, multiplicam-se desde a estreia de “A Espera”/”L’Attesa” no Festival de Veneza.
Aliando um poder visual clássico a um toque moderno de virtuosismo no trabalho de câmara e a já estandardizada banda sonora ambiente, melancólica (com acréscimo de uma faixa soberba dos The XX, ditando o tom e a rematar o filme), é sobretudo nas interpretações delicadas de Juliette Binoche e o seu italiano mais cuidado, da bela Lou de Laâge e o olhar que fala de Giorgio Colangeli, que “A Espera” é uma das apostas mais fortes da edição deste ano da Festa do Cinema Italiano: 8 1/2.
Após uma introdução majestosa, em cenário funesto em que se evoca a figura de Cristo, compreendemos, com uma linguagem de silêncios e puramente visual, o contexto sócio-cultural siciliano algures em 2004: católico, pio, de riqueza e, por oposto, servil. Os diálogos começam a preencher mais espaços assim que Jeanne (Lou de Laâge), francesa, chega a Itália para encontrar-se com Giuseppe, seu companheiro – o passado de ambos revela fragilidades, quiçá traições (há imenso subtexto e fica muito por dizer, o que é óptimo). Aquilo que Jeanne desconhece, à medida que deixa voicemails – não respondidos – a Giuseppe, é que este faleceu antes do reencontro. A mãe do falecido, Anna (Juliette Binoche), imersa numa mágoa profunda, torna-se anfitriã de Jeanne, optando por (quiçá por descompensação devido ao luto, talvez cobardia ou simplesmente para evitar dar um dos grandes desgostos da vida a Jeanne) esconder a morte do filho. Numa busca constante pelo paradeiro de Giuseppe aguardamos, desconfortáveis, pelo momento em que a verdade seja revelada. O trunfo de “A Espera” passa por esse dilema moral, essa dúvida suspensa sem momento certo para ser esclarecida – e que consequência terá para a relação de amizade que Anna e Jeanne constroem.
Messina arrisca no virtuosismo, porventura pouco sóbrio para uma trama tão minimalista (vagamente inspirada numa peça de Pirandello). Porém, aquilo que poderá roçar o pretensioso introduz, ao mesmo tempo, um cunho pessoal com uma certa novidade na aproximação estética ao drama, riquíssima, com alguns piscares de olhos à linguagem mais comercial, através de fórmulas que induzem outros cineastas em erro. Ganham as metáforas visuais: o cordeiro sem pele a marinar em vinho tinto ou o contraste de um arvoredo chamuscado versus a água límpida e apelativa de uma lagoa que dão, por exemplo, densidade ao ritual de perda de um ente querido, como à relação entre duas mulheres: uma jovem e outra madura, cuja empatia tem por base uma mentira.
A Festa do Cinema Italiano decorre até dia 7 de Abril. Consulte o Programa completo
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