Neste segundo volume, Riad Sattouf continua a falar-nos do seu crescimento na Síria, focando-se num período mais curto (1984-1985) do que o explorado no volume anterior (1978-1984). Este ano aqui descrito é um ano especial para o autor, no sentido em que marca o seu primeiro ano escolar, ou seja, o primeiro contacto com o ensino – neste caso o praticado na sua aldeia Ter Maaleh que, para não variar do resto desta obra, sobressai pela sua negatividade, tanto na forma como tratam os alunos a nível pessoal, como no próprio método de ensino em si.
“O Árabe do Futuro 2” (Teorema, 2016) – com o subtítulo Ser Jovem no Médio-Oriente (1984-1985) – continua a apresentar uma visão muito negra e atrasada em relação aos costumes Árabes o que, do ponto de vista de uma criança nascida na Europa, poderia até fazer algum sentido. O problema é que uma visão infantil de uma outra cultura tem um interesse muito limitado e ver Sattouf prolongar-se tanto neste registo faz-nos questionar o caminho que o autor continuará a perseguir nesta história. Não é que duvidemos das vivências pelas quais o autor passou. Contudo, sente-se a falta de um outro lado, de uma outra história do povo da Síria que teima em não ser contada. A visão que este livro nos transmite deste povo é uma visão muito uni-dimensional, que sobressai na sua grande maioria pelos aspectos mais cruéis. Lembrando os trabalhos de Joe Sacco ou até mesmo de Guy Delisle (para fugir a um estilo mais jornalístico), existia sempre uma preocupação em dar a conhecer uma variedade de formas de pensar, dentro de uma mesma cultura. Se o mundo não é a preto e branco, a Síria certamente que também não.
Focando-nos em termos mais técnicos, Sattouf continua a provar-se como um bom autor de Banda Desenhada, sendo capaz de construir, com uma aparente facilidade, uma narrativa envolvente e cheia de momentos de humor. Além do período escolar, existem outros momentos na vida familiar do autor que se tornarão momentos chave no moldar da sua personalidade e vocação. É sempre interessante aprofundar uma dinâmica familiar e, desta vez, iremos conhecer um par de personagens dignas de nota, em particular as femininas. Com a utilização de um traço mais caricatural, o autor continua a sublinhar o tom satírico com que conta esta história, um tom que se adequa às situações que Sattouf quer denunciar. Em termos de cor, a Síria mantém a sua tonalidade mais quente, ao contrário, por exemplo, da França mais fria, sempre retratada pelo azul. De resto, a cor serve sempre para salientar alguns objectos ou situações em particular.
Seria interessante que à medida que Rattouf – a personagem – fosse amadurecendo, também o fosse a sua visão do mundo. No entanto, com tanta ênfase dada na infância da personagem (em dois volumes ainda não saímos dela), será difícil imaginar que este seja o caminho que o autor vá seguir no futuro. Desta forma, resta-nos disfrutar dos bons momentos deste “Árabe do Futuro 2” – que os tem -, mas sem nunca esquecer que estamos perante uma visão enviesada de uma determinada cultura: há vida para além desta história.
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