Em “As Afinidades Electivas” (Bertrand Editora, 2017 – reedição), de Johann Wolfgang Goethe, seguimos o casal Eduard e Charlotte que, apaixonados desde a juventude, vivem tranquilamente dedicados à sua propriedade e aos projectos que têm para ela. A transformação dos jardins, a construção de um abrigo, a abertura de novos de caminhos, marca o ritmo do entretenimento das personagens com a paisagem e o seu ordenamento. A vida do casal altera-se com a chegada de novos hóspedes à sua casa.
O capitão, amigo de Eduard, que se encontrara sem trabalho, é convidado por este a viver em sua casa, ficando responsável pela administração das propriedades. A vinda do capitão é antevista por Charlotte com receio: “Nada é mais decisivo, em qualquer situação, do que a intervenção de um terceiro. Vi amigos, irmãos, amantes, esposos cuja relação se modificou totalmente, cuja situação se transformou por completo com o aparecimento, ocasiona o propositado de outra pessoa”. Se havia a reserva ao novo hóspede, rapidamente ela se transformou numa presença desejada, reforçando em Charlotte a vontade de trazer também para junto de si Ottilie, uma jovem bonita e discreta que vivia num internato.
Os quatro iniciam um quotidiano em coabitação e estão dados os elementos para as afinidades electivas, “as substâncias que, ao encontrarem-se, se apropriam rapidamente uma da outra e se determinam mutuamente”. Evidenciando a premissa do autor, de que “as afinidades só se tornam interessantes quando provocam separações”, o casal inicial dilui-se, emergindo então as novas ligações: Eduard e Ottillie, Charlotte e o capitão.
O leitor parece observar como operam as reacções químicas da paixão na transformação dos novos amantes, como estes se aproximam mas, sobretudo, se afastam, dado não lhes ser permitido viver o arrebatamento das paixões. O amor surge como o propulsor do sentido da vida, mas as personagens a ele sujeitas vivem o seu caos sem nada poderem fazer para alterar o curso dos acontecimentos. O amor pode ser imponente e impiedoso, como um rio a que o ser humano está sujeito quando se debate nas suas águas. A vida acontece sem desenlaces felizes.
“As Afinidades Electivas”, obra escrita em 1809, é apontada como um espelho do matrimónio do próprio Goethe, sendo um convite a olhar o casamento e as suas forças contrárias: o divórcio e a infidelidade.
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